Impressionante a capacidade que certas pessoas têm de se fazerem amar. Vera era assim. Uma criança a olhava pela primeira vez e logo se jogava em seus braços.

Não gerou filhos, mas foi mãe de muitos!

Tudo começou quando tinha treze anos. Meus sogros tinham loja e precisavam de alguém que olhasse o seu bebê, meu marido, supervisionada pela bisa, que cuidava dos afazeres domésticos e morava na mesma casa, com mais cinco filhas, desde que ficou viúva.

As meninas saíam para estudar, trabalhar e, muitas vezes, a mãe Vera ficou só com o menininho chorão. Foi seu “boneco”; o único que teve na vida muito pobre. Depois nasceu uma menina, minha cunhada Wilma, e Vera já estava tarimbada na arte de trocar fraldas e fazer mamadeiras. Era chamada de mãe Vera pela menina.

Quando a conheci, apresentou-se como tia, irmã das outras. Até se parecia com elas. Completamente inserida no contexto daquela família. Cuidou também dos filhos-sobrinhos que foram nascendo: Wagner, Flávio, Marco, Mary, Jorge Luiz, Ricardo, Elaine...

Não teve namorados. Qualquer pretendente se assustaria diante daquela jovem cercada de crianças.

Todos foram crescendo e já não precisavam de seus cuidados,... somente do seu amor. Era a tia Vera de todos.

Casei e continuei morando no bairro de Anchieta. Na época, Vera morava em Nova Iguaçu, com outra tia do meu marido, a Rosa..

Meu filho nasceu e tornou-se seu grande amor. Os primeiros trinta banhos foram dados por ela.

Eram sessenta fraldas de pano. Ela vinha diariamente, levava-as para lavar, passar e trazia-as no mesmo dia, como desculpa para poder estar mais tempo com o menino. Como o amava, meu Deus! Ele ficava aos berros quando ela ia embora. Eu tinha que distraí-lo e ela saía de fininho. Eu era tão grata que prometi que o próximo filho seria seu afilhado e ela, abraçada ao menino, dizia: “Ah! Eu queria que fosse ele!”

Tive dois abortos espontâneos, por isso a diferença de quase cinco anos entre o Júnior e a Viviane. Quando a menina nasceu, Vera vestiu-se de festa. Assumiu a afilhada desde o útero. Rosa era costureira de mão cheia e minha menina teve um guarda-roupa de fazer inveja. Os mesmos cuidados da Mãe- madrinha Vera.

Comecei a construir ao lado da casa dos meus pais e passamos a morar com eles. Com sete meses, Viviane teve alergia e constatamos que era devido à poeira da obra. A menina foi para a casa da madrinha, em Nova Iguaçu, e só vinha nos finais de semana. (Minha filha me chama de mãe desnaturada por causa disso), mas era para o seu bem. Eu ia lá vê-la no meio da semana . Isso aconteceu por uns dois meses. Elas, as duas tias, choraram muito quando a Viviane voltou de vez. Confesso que veio mais gordinha, mais rosadinha, mais saudável, enfim.

Quando a menina fez dois anos, submeti-me a uma cirurgia. Vera mudou-se para minha casa. Deixei-lhe um bilhetinho sobre a mesa: “Confio meus filhos somente a ti. Não necessitas de recomendações, pois cuidas melhor que eu.” Esse papelzinho foi plastificado por ela e trazia-o na bolsa como troféu. Já adolescentes, meus filhos viram o tal recadinho, intacto.

Chegou a conhecer os netos postiços e tratava-os com o mesmo desvelo. Quando a Gabriella, a terceira da Vivi nasceu, em Mato Grosso do Sul, cidade de Dourados, ela esteve por lá por algum tempo. Infelizmente, depois dos sessenta teve Alzheimer. Teimava em sair de casa e me surpreendia cada vez que surgia sozinha. Nós a levávamos e, muitas vezes se perdeu, chegando a passar uma noite fora, em Caxias. Era um desespero a procura e um alívio o reencontro.

Chegou a época em que não reconhecia mais nem meus filhos, nem os filhos deles. E todos voltavam muito tristes para casa. As perguntas eram repetidas e sempre as mesmas: “Como é o nome dela?” “Quantos anos tem?”

Faleceu aos 80 anos, mas para todos nós tornou-se imortal. Sua imagem, sua fala, seu carinho estão muito vivos na nossa memória. Ela veio ao mundo apenas para exercitar o amor e ensiná-lo aos pequenos. Não consigo contar as crianças que passaram pela sua vida, sem compromisso, pura doação. Eram parentes, filhos de vizinhos e até pequeninos que se jogavam em seus braços nos ônibus ou em qualquer recinto que estivesse.

Ela tinha uma luz que atraía! Só as crianças conseguiam ver!


 

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